Bom vamos começar com o termo correto. Para o direito civil tudo o que não está na lei é permitido, diferentemente do direito administrativo onde ocorre o contrário, o que não está na lei é proibido. Passada essa definição vamos a outra: o correto - em se tratando de liberação da maconha para uso recreativo - é o termo DESCRIMINALIZAÇÃO da maconha, mas porque isso?
Houve um tempo que boa parte das drogas, que são proibidas hoje, eram de livre comércio. A maconha ou Canabis ou ainda Marijuana, entre tantos nomes, já foi comercializada livremente inclusive aqui no Brasil onde era tida com desdém por ser "fumo de preto". Isso mesmo, os negros usavam a maconha no seu dia a dia fosse como fumo ou como chá ou como diversos outros tipos de uso.
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Depois de um bom tempo é que a maconha foi criminalizada. Essa criminalização andou muito próxima da criminalização do preto. Daí o fumo do preto foi proibido porque o ser preto foi proibido. Percebe como essa planta está enraizada no nosso país? Percebe como ela representa uma guerra perdida assim como várias discriminações?
"Disseminada entre negros e índios, seu uso, conhecido como maconhismo, diambismo ou canabismo, hábito de consumir a canabis (bebida, comida ou fumada), tornou-se relacionada a uma prática dos negros e pobres, sendo referida como resquício dos hábitos dos escravos." (Pessoa, Mariana Carvalho, 2017, p 25)
"... ministro Barroso expõe que “os jovens de classe média para cima moradores dos bairros mais abonados como regra são enquadrados como usuários; os jovens mais pobres, vulneráveis, que são alvo preferencial das forças de segurança pública são enquadrados como traficantes”. Portanto, é destacado que há diferenciação criminal entre o usuário e o traficante, e envolve questões raciais e socioeconômicas na sociedade brasileira." (Pessoa, Mariana Carvalho, 2017, p 54)
Agora você já sabe porque o correto é chamar descriminalização da maconha.
Você também já deve ter lido minha matéria anterior sobre a descriminalização da marijuana que fiz em 2012 neste mesmo blog. Revisitando essa matéria pude aferir duas coisas: uma, que eu escrevia mal pra caramba; outra, que eu mudei totalmente de idéia.
Eu me considerava neutro no assunto (já mudei de ideia de muitas coisas na minha vida, eu era de direita e estudando fui me tornando um esquerdista) mas hoje tenho um lado que escolhi, ao meu ver, fazendo a melhor análise que eu, como ser limitado, pude fazer.
Vamos a essas reflexões:
Confesso que primordialmente era avesso à maconha como dá para se ter ideia no meu artigo anterior sobre a
legalização da canabis. Mas hoje enxergo esse tema em duas esferas.
Uso Recreativo
No Uruguai, Canadá e em Portugal que foram pioneiros na descriminalização do uso recreativo da maconha (sim eu sei que existem alguns outros países que turista só vai para experimentar a maconha, mas nesses países ainda é proibido o uso recreativo, todavia nasce canabis em todo lugar aí acabam tendo dificuldades de fazer o controle. Há ainda outros países em que a maconha é proibida, mas as autoridades simplesmente fecham os olhos para o comércio com ares de LEGAL dessa droga, mas Uruguai, Portugal e Canadá são os primeiros países com um grande histórico de guerra às drogas que pararam, pensaram e descriminalizaram a maconha, Portugal fez até mais, descriminalizou cocaína também), Estados Unidos vem, depois de ver os resultados obtidos principalmente em Portugal e Uruguai (onde o consumo caiu muito num primeiro momento, não só da maconha, mas de outras drogas também), e passa a permitir em alguns estados.
Analisando os dados do Uruguai por exemplo vemos que é possível descriminalizar (deixar de prender centenas de negros usuários) a maconha, cobrar impostos elevados e injetar esse dinheiro na saúde pública para recuperar viciados em drogas mais pesadas. Porém é claro que é necessário uma série de legislações para evitar o tráfico legal para outros países assim como importar de outros países. Não é só liberar o comercio e plantio e pronto, acabou. Por exemplo: No Uruguai existe um limite de quantos pés de maconha uma pessoa pode ter em casa (até 6), ai é analisado qual o motivo do uso, se é por alguma doença, qual a quantidade necessária por dia... ETC. Para os que preferem ter tudo pronto para uso a taxa de imposto é alta chegando a 100 dólares uma quantia de cerca 40g, de 100 a 300 dólares para fazer parte de um clube e ter direito até 99 pés de maconha. O que ao longo do ano permite uma colheita maior que 40g mas que tem que lidar com os mesmo problemas de quem planta em casa: processar de maneira profissional para que as substâncias mais importantes não sejam alteradas.
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Deve-se considerar também que mesmo sendo o primeiro país do mundo em liberação para uso recreativo, a descriminalização não foi capaz de enfraquecer o tráfico, nem de freiar as mortes pelo tráfico. Pepe Mujica (presidente uruguaio de esquerda que aprovou a descriminalização), diz que é importante manter a não criminalização para que os usuário possam manter o uso moderado da maconha e não partam para o uso de drogas mais pesadas, porém ao mesmo tempo urge que o tráfico de drogas pesadas, que aumentou desproporcionalmente, seja combatido com inteligência. Além disso, o tráfico oferece uma maior variedade e preços mais baixos o que leva a população mais pobre a ter que recorrer ao tráfico. Todos esses fatores são frutos de muito estudo sobre o assunto e dependem de ação política para se tornar mais efetiva a queda do tráfico.
Ainda sobre o Uruguai: as mortes por cem mil habitantes subiram para dois dígitos, segundo analistas: isso se deve à expansão e pelejas entre facções do tráfico. Também aumentou a quantidade de drogas uruguaias apreendidas principalmente na Europa, o que é um dos indicadores que o tráfico está ganhando força ao invés de perder. Ou seja, não é só liberando a maconha que o tráfico para de existir. Deve-se adotar medidas para que os usuários mais pobres não fiquem desamparados e, além de tudo usar os impostos coletados da venda da canabis no combate direto ao vício em outras drogas (investindo dinheiro em organizações de reabilitação e oferecendo o serviço gratuitamente à população) como também no combate ao tráfico que demanda muito dinheiro para se criar um núcleo de inteligência capaz de encontrar os verdadeiros traficantes que são aqueles que usam terno e gravata.
Quanto ao tratamento dos viciados em maconha? Eu sinceramente só conheci um usuário de maconha que diz ser viciado (numa clinica de reabilitação), a maioria não vicia. O que pode ocorrer é o usuário ficar preso ao hábito de fumar a canabis, para estes casos um cigarro comum já resolve o problema.
Outra coisa: maconha não dá overdose. Sabe quantos casos de overdose de maconha temos no mundo? Zero.
Uso Medicinal
O primeiro ponto que liga a maconha à saúde é que pessoas com propensão à esquizofrenia podem acelerar a piora do seu quadro se usarem maconha. Isso já é comprovado em várias literaturas a respeito. Então se tem alguém na família com histórico de esquizofrenia, a maconha não é pra você.
O segundo ponto é o uso por pessoas que têm doenças crônicas e que podem ser aliviadas com o uso da canabidiol ou da tetraidrocanabinol (THC) isoladas em forma de medicação. Já pensou numa família de uma pessoa que tem alguma doença crônica como o parkison, câncer... ETC, ter que ir até uma boca de fumo, comprar escondido, esconder dentro de casa para que ninguém descubra, correndo o risco inclusive de ser preso(a) por tráfico se forem pretas? Isso não é aceitável no século XXI.
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Até por isso, precisa ser liberada livremente - sim vou cometer esse pleonasmo, mas já explico o porquê - para todo e qualquer tipo de estudo científico em relação às inúmeras substâncias que existem na maconha, algumas até já usadas em outros países, como é o caso da canabidiol (CBD) e da substância tetraidrocanabinol (THC) que já possuem um vasto espectro de pesquisas, mas que aqui no Brasil ainda são vistos como demônios, fazendo com que famílias que têm algum ente que precise dessas substâncias tenham apenas três opções: Importar caro dos EUA (e ai pode cotar cerca de cinco mil reais/mês), entrar com um processo longo e doído contra o estado para que este passe a fornecer esta medicação (mas isso só vale para quem tem dinheiro para bancar uma demorada e incerta decisão judicial e tempo, muito tempo para esperar) ou recorrer aos meios ilegais e menos saudáveis como ter que comprar do tráfico ou plantar escondido em casa. Para mudar essa realidade é necessário que os cientistas tenham acesso livre à maconha, o que acontece hoje é que se dá o acesso, mas junto dele vem uma série de normas que dificultam o trabalho científico.
Me responda, onde está o direito à dignidade que nossa constituição prega? É por isso que acho que as pesquisas brasileiras sobre a maconha deveriam ter acesso irrestrito à plantação e reprodução desse item, isso resultaria na fabricação no Brasil de substâncias isoladas, extraídas da maconha, portanto mais controláveis.
E antes que assumam que sou apenas mais um usuário tentando justificar o seu vício, esse não é o caso. Como todo jovem de Recife (onde passei grande parte da minha juventude) experimentei duas vezes, não me viciei e parei com o uso por ter caso de esquizofrenia na família.
Referências
E você o que tem a dizer sobre a maconha?
Espero que tenha gostado da matéria.
À plus tard
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